Abusividade e ilegalidade da cobrança de tarifas nos contratos de financiamento bancário.

Em meio à grave crise da qual o Brasil vem se recuperando nos últimos anos, um dos setores da economia que recuperou o status de protagonista foi o de financiamentos bancários, tendo destaque dentre eles o
nicho de financiamento de veículos novou ou usados.

De acordo com informações divulgadas no G1 só o setor de financiamento de veículos novos sofreu um aumento de 14.7% no primeiro semestre do ano. É o que apontam os dados da pesquisa da B3, empresa que opera a base integrada de dados que reúne o cadastro das restrições financeiras de veículos oferecidos como garantia em operações de crédito. O Estado do Ceará sozinho representa um avanço considerável de 3% no
número de novos financiamentos realizados.

Não restam dúvidas que o modelo de negócio é uma fonte de lucros incalculáveis para os grandes bancos e instituições financeiras do país. O que muito se discute são os encargos embutidos nestas operações de financiamento, ou seja, até onde vai a legalidade daquilo que o banco cobra e, não menos importante, se ainda que permitidas algumas cobranças, se são de alguma forma abusivas.

Assim, o objetivo do presente artigo é esclarecer ao leitor de forma sucinta o que são os valores que o banco cobra, quais dessas cobranças são permitidas nesse tipo de operação específica de financiamento e, quando cobradas, qual o limite delas. Inicialmente, cabe esclarecer que os valores cobrados pelo banco se dividem em três grandes grupos: taxa de juros, multas/encargos por atraso e tarifas, de modo tal que aqui trataremos somente das tarifas que podem ou não constar dos financiamentos.

De forma clara e objetiva, são permitidas aos bancos e instituições financeiras a cobrança das tarifas de cadastro, de avaliação de bem e o ressarcimento de registro de gravame. Por outro lado, não são permitidas a cobrança de tarifa de abertura de crédito (TAC), tarifa de emissão de boleto/carnê (TEC), tarifa de renovação de cadastro e ressarcimento de serviços de terceiros. No entanto, cada uma possui suas particularidades, razão pela qual passa-se a explicar adiante um pouco mais sobre cada uma delas.

A tarifa de cadastro é cobrada quando o cliente tem seu primeiro contato com o banco ou instituição financeira. A circular 3.371/07 do Banco Central do Brasil autoriza a cobrança desta quantia uma única vez, para remunerar os serviços de consulta aos órgãos de proteção ao crédito, base de dados, informações cadastrais e demais serviços que forneçam ao banco informações acerca daquele novo cliente. O que surpreende aqui são os valores cobrados. Enquanto nos bancos públicos estes valores giram normalmente em torno de R$ 20,00 a R$ 60,00, nos bancos privados giram em torno de R$ 440,00 a R$ 3.000,00. Esta discrepância no valor permite ao consumidor discutir em juízo a abusividade do valor cobrado, em que pese a legalidade da cobrança. E como parâmetro para estipulação do valor, via de regra se observa a média de mercado.

Já a tarifa de avaliação de bem, tem sua cobrança permitida através da resolução 3.919/10 do Conselho Monetário Nacional, que em seu artigo 5º, inciso VI admite a cobrança de remuneração pela prestação de serviços diferenciados a pessoas físicas, desde que explicitadas ao cliente ou usuário as condições de utilização e de pagamento, assim considerados aqueles relativos a avaliação, reavaliação e substituição de bens recebidos em garantia. No entanto, note-se que é indispensável para a cobrança que a referida tarifa esteja expressamente discriminada no contrato.

O ressarcimento do registro do gravame é referente ao valor cobrado pelo Detran para fazer constar em seu banco de dados que aquele veículo que está sendo financiado não pode ser livremente comercializado. Como o Detran cobra para efetuar este registro denominado gravame, os tribunais entendem que este custo pode ser repassado ao consumidor.

Noutro giro, as tarifas ilegais como TAC, TEC, tarifa de renovação de cadastro e ressarcimento de serviços de terceiros representam quantias inerentes ao exercício da atividade. Isso significa dizer que estes custos são próprios da atividade exercida pelas instituições financeiras e pelos bancos, de modo tal que em nenhuma hipótese podem ser repassados ao consumidor. Outrora estas cobranças já foram permitidas, porém foram vedadas por meio de circular do Banco Central e resoluções do Conselho Monetário Nacional. Mas, ainda hoje é comum que os bancos façam esse tipo de cobrança, muitas das vezes transmutadas com outras nomenclaturas.

Disto conclui-se que, caso seja verificada nos contratos de financiamento algum tipo de cobrança acerca das tarifas acima ventiladas, o consumidor tem direito a restituição do valor pago indevidamente e em dobro, pois considera-se má fé por parte das instituições proceder com as respectivas cobranças.

Guilherme.perdomo@santiagoeperdomoadvocacia.com.br

REFERÊNCIAS:

CABRAL, Bruno. Financiamento de veículos novos avança 3% no CE. 2018. Disponível em <http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/negocios/financiamento-de-veiculos-novos-avanca-3-no-ce-1.1969010> Acesso em 13/08/20118.

G1. Financiamento de veículos novos sobe 14.7% no 1º semestre. 2018. Disponível em <https://g1.globo.com/carros/noticia/2018/07/18/financiamento-de-veiculosnovos-sobe-147-no-1o-semestre.ghtml> Acesso em 13/08/2018.

BACEN. Circular Nº 3371. 2007. Disponível em <https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/circ/2007/pdf/circ_3371_v2_L.pdf> Acesso em 13/08/2018.

BACEN. Resolução CMN 3919. 2010. Disponível em <Resolução nº 3919 de 25/11/2010 / BACEN> acesso em 13/08/2018.